Seminário

Advogados apontam os maiores abusos cometidos contra os idosos

  • Seminário : O consumidor idoso em Porto Alegre. Na foto, o professor de Direito da PUCRS, Dr. Cristiano Schimitt.
    Para Cristiano Martins, sociedade não está preparada para cuidar dos idosos (Foto: Henrique Ferreira Bregão/CMPA)
  • Seminário : O consumidor idoso em Porto Alegre.
    Vereador Cassiá Carpes (c) preside a Cedecondh (Foto: Henrique Ferreira Bregão/CMPA)

O presidente da Comissão Especial do Idoso da OAB/RS, Cristiano Martins, criticou duramente as políticas públicas voltadas à população mais velha, sobretudo no quesito Saúde Pública. O advogado, especialista em Direito do Consumidor, foi o primeiro palestrante do I Seminário do Consumidor Idoso de Porto Alegre da Comissão em Defesa do Consumidor Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh), nesta quinta-feira (26/10), realizado no Plenário Ana Terra. Segundo Martins, 80% dos crimes contra idosos são praticados por quem deveria cuidar dele: parentes, vizinhos, empregados e casas geriátricas: “Nem o poder público nem a sociedade estão preparados para cuidar dos idosos”, pontuou Martins. 

Tomando como exemplo o Sistema Único de Saúde, o presidente da comissão especial da OAB sustentou que, por funcionar mal, o SUS terceirizou a população, sobretudo os idosos, nos planos de saúde privados, onde, segundo o advogado, são vítimas de crimes contra o consumidor por conta dos aumentos constantes das anuidades. No entendimento de Martins, esses aumentos abusivos configuram duplo crime porque se tratam de prática contra o consumidor e discriminatória a uma camada social, definida como hipervulnerável na forma a lei. 

Estatísticas

Com relação a Porto Alegre, Martins advertiu para uma situação ainda mais grave. Com 250 mil idosos, aproximadamente 15% de sua população total, a cidade tem a maior população na faixa etária acima dos 60 anos no país, em percentual e contando com 50 leitos SUS destinados à camada mais pobre. “Eles não têm onde ficar quando adoecem”, condenou o advogado. 

O especialista analisou o tema ainda do ponto de vista das estatísticas nacionais, alertando para o agravamento da situação. Disse que o Brasil tem 20,6 milhões de idosos e, nas próximas décadas, esse número irá subir na base de 10 milhões a cada dez anos até 2060. “O Brasil já alcançará a posição de sexto país mais velho do mundo em 2025”, assinalou o palestrante.  

Retrocesso

De acordo com a coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública, Larissa Prado, todos os contratos de adesão, como é o caso dos Planos de Saúde, atingem toda a população e pregam peças. Para ela, as mudanças na legislação dos planos, anunciadas pelo governo, são um cheque em branco para as prestadoras do serviço aplicarem preços da forma como bem entenderem.

“Dificuldade de ler, prazos de validade, cláusulas de obrigação, regras de correção de valores vêm em letras miúdas. Inclusive eu não consigo ler”, reconheceu Larissa. Ela informou que a Defensoria Pública atende a população de idosos, independente da faixa salarial ou de aposentadorias e benefícios, por se constituir em população hipervulnerável”.

Professor de Direito da PUC, Cristiano Schmitt versou sobre o tema proteção do idoso no mercado de consumo. “Os grupos mais vulneráveis da sociedade estão no contexto de fissuras na saúde pública, contratos de empréstimos. O estado não cumpre sua função social de criar as condições para a promoção da saúde pública”, reforçou Schimitt. “O idoso, com medo de ficar doente, adere ao plano de saúde. Se o plano fica muito caro, ele é atingido pela propaganda enganosa de empréstimos consignados e remédios milagrosos que curam suas doenças”, argumentou o professor da PUCRS.

Contraponto

Especialista em educação financeira para idosos e pesquisador da Faculdade de Educação da UFRGS sobre o comportamento do idoso como consumidor, o professor Johannes Doll foi portador da boa notícia. A grande maioria dos idosos brasileiros está na classe média. Sua condição econômica melhorou na última década. Mora em casas próprias e depende pouco dos mais novos. “O grupo é heterogêneo. O Chico Buarque tem 70 anos e o Pelé, 73; porém, não são vulneráveis. Muitos idosos administram muito bem suas vidas”, garantiu o professor. O grupo mais vulnerável é infinitamente minoritário e está de fato nas camadas mais pobres e de baixa escolaridade, precisou o professor da UFRGS. 

Considerações

Antes das palestras, os participantes da mesa debateram algumas propostas. Sugeriram a produção de mais projetos de lei em âmbito municipal em favor dos idosos. Eles entendem que se o município está com as finanças combalidas precisa gastar melhor. O presidente da Cedecondh, vereador Cassiá Carpes (PP), ponderou que a Lei Orgânica engessa a atividade legislativa justamente na parte mais simples. “Quando as prerrogativas são da Casa, ela cresce. Tentaram aumentar o IPTU com um projeto sem discussão e derrubamos. Agora querem alterar o plano de carreira dos servidores e nós estamos barrando”, sustentou Carpes.

A vereadora Comandante Nádia (PMDB) disse que um seminário para debater os direitos dos idosos coincide com a doutrina que ela aprendeu em sua carreira na Brigada Militar: “Eu vim de uma instituição em que se valoriza muito o passado e as pessoas que deixaram exemplo. Aqui fora as coisas não funcionam bem assim”, opinou a vereadora.

Participaram do evento representantes do Conselho de Defesa do Consumidor (Condecon), do Conselho Municipal do Idoso (Comui), da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB, da Fasc e de diversos asilos de idosos e conselhos comunitários. A partir do seminário, a ideia é criar um grupo de trabalho para elaborar uma cartilha informativa sobre os direitos, legislação, como buscar ajuda do poder público para se defender de abusos, telefones úteis dos órgãos de defesa dos idosos, entre outras informações. Outra atribuição do grupo é buscar formas de difundir as informações nas comunidades de Porto Alegre.

Texto: Fernando Cibelli de Castro (reg. prof. 6881)
Edição: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)