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Catadores querem continuar a trabalhar nas ruas da Capital

Cedecondh pedirá prioridade para projeto que estende permissão de carrinheiros até 2022

  • Por que restringir o trabalho e a circulação de catadores carrinheiros em Porto Alegre?
    Os trabalhadores levaram cartazes para pedir ajuda aos vereadores (Foto: Josiele Silva/CMPA)
  • Por que restringir o trabalho e a circulação de catadores carrinheiros em Porto Alegre? Na foto: Vereadores Cassiá Carpes, Marcelo Sgarbossa, Prof. Alex Fraga e Monica Leal.
    Vereadores da comissão defenderam a regularização do trabalho dos catadores (Foto: Josiele Silva/CMPA)

A Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto Alegre realizou uma reunião na tarde desta terça-feira (21/2) para discutir sobre a proibição da circulação de Veículos de Tração Animal (VTAs) e de Veículos de Tração Humana (VTHs) em Porto Alegre. A Lei Nº 10.531/08 proíbe o uso dos  VTAs desde setembro de 2016 e os VTHs  tiveram o prazo prorrogado até o dia 10 de março de 2017 por um projeto do vereador Marcelo Sgarbossa (PT). A Lei previa ainda a retirada dos catadores do serviço de reciclagem através do programa Todos Somos Porto Alegre com a disponibilização de cursos e a inserção no mercado de trabalho. 

“A nossa vida depende do carrinho”, expôs o representante da Associação de Reciclagem Ecológica da Vila dos Papeleiros, (Arevipa), Antônio Carboneiro, que afirmou que os carrinhos não podem ser proibidos. Ele também contou que fez os cursos do Somos Todos Porto Alegre, trabalhou em algumas empresas, mas era dispensado pela falta de oportunidades de emprego e voltava para a coleta de resíduos. "A nossa luta é pelo nosso trabalho. Eu não vou deixar a minha família passar necessidade”, afirmou.

Da mesma forma, questionou a integrante da Associação Comunitária Vila Dique Resiste, Scheila Motta: “Querem deixar nossas famílias passando fome?” Ela explicou que os catadores são criminalizados quando deveriam ser vistos como protetores do meio ambiente, pois “a maior parte da coleta de lixo reciclável é feita por eles porque a prefeitura não consegue dar conta do serviço”. Scheila comentou que os cursos oferecidos pelo programa são bons, mas que não são muito efetivos porque há muitas pessoas que não sabem ler nem escrever e, por isso, não conseguem aproveitar o que é ensinado. 

O presidente da Associação de Moradores da Beira do Rio, José Pedro Souza, falou da dificuldade que os trabalhadores enfrentarão com o funcionamento da lei. “Centenas de pessoas irão passar fome, isso nem as autoridades e a sociedade vão ver”, lamentou. Ele também é favor da prorrogação da lei para garantir a sustentabilidade das pessoas que trabalham no ramo. Já a representante dos Pequenos Galpões de Triagem, Alexandra Souza, afirmou que o carrinho é a única forma de eles conseguirem se sustentar e que muitas famílias o utilizam como meio de transporte, principalmente, nos locais em que não há transporte coletivo. “É um crime o que essa lei está propondo.”   

Integrante do Movimento Nacional de Catadores de Recicláveis, Alex Cardoso contou como a classe vem sendo desvalorizada. “Os catadores são extremamente organizados numa cidade em que não são bem acolhidos. É um projeto com preconceito de origem”, sintetizou, ao afirmar que é preciso valorizar o trabalho, que, acima de tudo, contribui para o meio ambiente. Também em crítica à Lei das Carroças, Antônio Mattos, da Unidade de Triagem, falou da falta de secretarias envolvidas que não contemplam o projeto. “É preciso atender a questão do ambientalismo, o que está em jogo são a vida dessas pessoas”, disse. 

A participação do Poder Público 

A assessora da Secretaria Municipal de Relações Institucionais, Denise Souza, falou sobre a importância do trabalho do catador digno e respeitado. De acordo com ela, o programa Todos Somos Porto Alegre reconhece o catador como protagonista. “Vamos continuar implementando ações no programa, como a produtividade que vem crescendo mesmo com a crise”.  Ela também disse que é necessário sair da lógica de assistência social para reconhecimento do trabalho capacitado do catador.

Segundo a promotora de Justiça e Meio Ambiente do Ministério Público, Annelise Monteiro, a discussão é muito mais complexa do que proibir ou não o uso destes carros. “Ela envolve todo o sistema de coleta de lixo da cidade e não é essa lei que vai abarcar todo esse assunto”. 

Membro da Cedecondh, a vereadora Mônica Leal (PP) abordou a importância da reunião de líderes de movimentos e representantes do Executivo para encaminhamento das solicitações apontadas no evento. Ressaltando que é preciso ter uma visão conjunta do projeto, a vereadora Fernanda Melchionna (PSOL) também citou questões do funcionamento de coleta, prezando que a política de "higienização" não continue e que o trabalho dos catadores seja descriminalizado. 

Também integrando a mesa de convidados, Maristela Maffei, assessora parlamentar da EPTC, disse que a rede não funcionará sem integração. A representante do órgão de trânsito afirmou ser fundamental que haja um grupo para articular a qualificação do trabalho de coleta e ressaltou o trabalho ambiental da EPTC. Já Andreia Morais, representante do DMLU, falou sobre a questão de licenciamento em todos os locais de unidades de triagem com estrutura debilitada e que tudo deve ser encaminhado para ajeitar a situação dos catadores.  

Conforme o presidente da Cedecondh, Marcelo Sgarbossa (PT), as dinâmicas do parlamento que entram em ação não atendem as demandas complexas dos trabalhadores. Ele disse que protocolou um projeto de lei em 30 de dezembro de 2016 com o objetivo de prorrogar até 2022 o prazo para que a Lei das Carroças entre em vigor. Segundo o vereador, se a lei for posta em prática em 10 de março de 2017, cerca de 6 mil catadores ficarão impossibilitados de trabalhar, pois utilizam o carrinho para transporte os materiais recolhidos.

Também participaram da reunião os vereadores Cassiá Carpes (PP), Prof. Alex Fraga (PSOL), Matheus Ayres (PP) e Airto Ferronato (PSB), além de representantes da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), da Secretaria do Desenvolvimento Social e da Fundação Solidariedade. 

Encaminhamentos

A Cedecondh decidiu, em conjunto com as instituições e públicos presentes na reunião, fazer os seguintes encaminhamentos:

- Sugerir na reunião de Líderes da Câmara Municipal que o projeto de lei de Marcelo Sgarbossa (PT) tenha preferência nas votações da Casa;
- Realizar uma visita aos galpões de reciclagem de lixo com o Ministério Público;
- Modificar a Lei nº 10.531, de 10 de setembro de 2008, a fim de prorrogar o prazo da restrição de VTH’s – carrinheiros –, o que permitirá aprofundar a identificação dos catadores e carrinheiros, chegando a um número mais próximo da realidade;
- Mudar o Programa Todos Somos Porto Alegre (TSPoa) para acolher os arranjos produtivos locais, ou seja, o indivíduos da coleta individual e os pequenos  galpões das comunidades;
- Construir com a participação efetiva do público alvo (carrinheiros-catadores) pequenos galpões nas comunidades; 
- Propor emendas de lei visando a adequação da legislação municipal com a legislação federal 12.305, de 2010 – que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos – com a Lei nº 10.531, de 2008 e/ou propor um PL instituindo a uma Política Municipal de Resíduos Sólidos;
- Solicitar os resultados do seminário de avaliação do programa Todos Somos Porto Alegre realizado no MPT-RS, em 28/11/2016.

Texto: Cleunice Maria Schlee (estagiária de Jornalismo)
           Munique Freitas (estagiária de Jornalismo)
Edição: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)