Seminário

Promotor critica legislação criminal permissiva e sistema punitivo

O desembargador Leandro Paulsen, do TRF-4, e o delegado federal Alexandre Isbarola também participaram do painel Julgamento, da Acusação e da Defesa no Direito Brasileiro

Painel "Acusação e defesa no Direito Brasileiro" no Seminário Internacional Um Pacto Brasileiro pela Segurança. Na foto, ao microfone, o superintendente da Polícia Federal/RS, Alexandre Isbarolla.
Leandro Paulsen, a vereadora Comandante Nádia, Alexandre Isbarola e Bruno Amorim Carpes (d) (Foto: Ederson Nunes/CMPA)

O promotor de Justiça Bruno Amorim Carpes, do MP-RS, pintou um quadro desanimador sobre o atual estágio do combate à criminalidade no Estado do Rio Grande do Sul e no Brasil. Segundo ele, a porcentagem de crimes que chegam para a Polícia como ocorrência é simplesmente desconhecida. Se na Colômbia são 28% e nos EUA, 50%, imaginem no Brasil”, comparou. Carpes participou do painel Julgamento, da Acusação e da Defesa no Direito Brasileiro, o terceiro da tarde desta sexta-feira (3/8), dentro do Seminário Internacional Um Pacto Brasileiro para a Segurança – realização da Câmara Municipal de Porto Alegre por meio da Escola do Legislativo Julieta Battistioli. O painel, que teve também como palestrantes o desembargador Leandro Paulsen, do TRF-4, e o superintendente da Polícia Federal no RS, Alexandre Isbarola, foi coordenado pela vereadora Comandante Nádia (MDB).

Para Bruno Carpes, a legislação brasileira é permissiva com relação à criminalidade, e o sistema punitivo funciona como um convite aos delitos de toda a natureza. Ele aponta para a falta de efetividade das investigações por conta do enfraquecimento do Ministério Público e das Polícias Judiciária e Científica. Com efeito, 8% dos homicídios são elucidados e 1% dos roubos. Ele informou que o país registrou 1 milhão e 800 mil roubos no ano passado, com 150 mil condenações. 

Carpes criticou ainda o sistema em que, após 1/6 de cumprimento da pena, o criminoso pode começar a progressão da mesma. Em Portugal, observou, para obter a regalia são necessários 50% de cumprimento em regime fechado, e, na Argentina, 4/5. “Na grande maioria do mundo civilizado, não existe nenhuma progressão”, ressaltou. No seu entendimento, os indultos promovidos no âmbito da Presidência da República funcionam como uma espécie de agressão à sociedade, e as penas de prestação de serviço para chefes do crime organizado são uma afronta à sociedade civil.

Avanços e novos paradigmas

O superintendente da Polícia Federal no Rio Grande do Sul, Alexandre Isbarola, contrapôs para o fato de que o país começa a romper com seus próprios paradigmas, entendendo que a aceleração tecnológica modificou a forma como o crime se organiza e se retroalimenta, extinguindo as fronteiras. “A forma como se vive e se trabalha é a quarta revolução industrial, a transformação ocorre e será ainda mais rápida do que imaginamos”, ponderou o delegado federal. 

Conforme Isbarola, a revolução tecnológica impacta o Direito e a Segurança. Para a realidade brasileira, todo o avanço traz o crime transnacional, enfrentado sob a realidade de um Código Penal de 1940 e o de processo penal também do século passado, que precisam ser modificados para se adaptar à investigação criminal moderna, em que o dinheiro sujo não viaja mais de avião, mas é apenas uma informação a transitar via computadores, em escala global. Mesmo assim o país avançou, opinou o delegado. O Brasil, a seu ver, passou a integrar os sistemas internacionais de investigação, assinou as novas convenções internacionais que versam sobre os crimes de lavagem de dinheiro, o crime organizado e o combate à corrupção, em tratados e fóruns internacionais. 

O passo seguinte, ensinou o superintendente da PF, está em andamento: a melhora do financiamento e do investimento em tecnologia, informação, integração e inteligência. Com isso, o país está começando a integrar, com maior peso, as forças internacionais de combate à criminalidade como a Interpol e a Ameripol. Internamente, a Polícia Federal criou o Centro de Cooperação Internacional de Investigação. “Sem ação integrada de inteligência não há como enfrentar o tráfico internacional de armas”, exemplificou Isbarola. 

Proteção da sociedade

No entendimento do desembargador Leandro Paulsen, do Tribunal Federal da 4ª Região (TRF-4), um dos integrantes da turma julgadora da Operação Lava-Jato, em segunda instância, o processo penal tem como objeto a proteção da sociedade. Para ele, a Constituição denominada Cidadã deveria promover a dignidade da pessoa humana por se fundamentar como o princípio estruturante da sociedade brasileira. “Proclama muitos direitos, direito à vida, direito de ir e vir e direitos sociais, mas a maior parte fica no papel porque a sociedade precisa avançar”, advertiu o magistrado. Ele acredita que a Justiça está mudando sua forma de atuar, pois antigamente era muito ágil para condenar os pobres e muito lenta para julgar os ricos.

“O que se garante hoje é a investigação de toda a forma de crime, o direito amplo à defesa, mas com a punição efetiva do réu se este for culpado. O Estado tem a obrigação de dar proteção satisfatória para a sociedade. Um crime é um atentado contra toda a nação e atinge toda a população”, enfatizou Paulsen. “A criminalidade crescente afeta a paz social, afeta as vidas, retira a espontaneidade para usar os parques, sair na rua. Não há garantia de que os governos estejam representando com espírito público”, acrescentou o desembargador federal. 

Paulsen tem a convicção de que o combate ao crime do colarinho branco é o primeiro passo a produzir proteção social, a partir do momento em que a sentença em segunda instância garante o começo do cumprimento da sentença. “A decisão da Justiça vem de um conjunto de avaliações com método dialético alicerçado em autoria, materialidade e elemento subjetivo que formam o conjunto de provas”, continuou Paulsen. E finalizou: “Toda a sentença é definitiva porque ninguém tem garantia de quando um processo sairá, se é que sairá da primeira para a segunda ou terceira instância”.

Último painel

O Modelo Americano e o Modelo Brasileiro de Justiça, Violência e Criminalidade, que teve início às 18 horas, é o último painel do seminário, realizado no Plenário Otávio Rocha, da Câmara. Participam os seguintes palestrantes:

Michael Parker, ex-chefe de Segurança da Polícia de Los Angeles, Consultor em Segurança da The Parker Group/EUA;

Marcelo Rocha Monteiro, procurador do Ministério Público/RJ;

Nelson Jobim, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal;

General Carlos Bolivar Goellner, representando o Ministro de Estado e Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência do Brasil.  

Texto: Fernando Cibelli de Castro (reg. prof. 6881) 
Edição: Claudete Barcellos (reg. prof. 6480)