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Cuthab debate ocupações em Porto Alegre

Moradores das vilas irregulares lotaram o plenário Otávio Rocha, na Câmara Foto: Guilherme Almeida
Moradores das vilas irregulares lotaram o plenário Otávio Rocha, na Câmara Foto: Guilherme Almeida (Foto: Guilherme Almeida/CMPA)
A Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab) se reuniu nesta manhã (23/6), no Plenário Otávio Rocha da Câmara Municipal, para falar sobre as áreas que estão sendo ocupadas em Porto Alegre. A reunião foi presidida pelo vereador Engenheiro Comasetto (PT), que destacou que, atualmente, existem 40 comunidades com ordem de reintegração de posse. "Mas não é possível serem feitas essas reintegrações, pois no ar ninguém vive, e estamos esperando que a prefeitura apresente um projeto de reforma urbana para que essas pessoas tenham onde morar", disse. O vereador ressaltou que o Ministério das Cidades está iniciando a construção de uma política que insere as ocupações em um debate mais amplo e fundamentado.
"Eles criaram um grupo de resolução de conflitos que está tratando dos embates de reintegração de posse, retirando 14 processos dos juízes", afirmou. No entanto, Comassetto destacou que existem algumas ocupações fora deste grupo, e o objetivo é construir um entendimento e um conhecimento na defesa da moradia e ir ao encontro de uma política de habitação.

Ao final da reunião, ficou decidido que será solicitada uma reunião com o governador do Estado, José Ivo Sartori, e com o prefeito José Fortunati para que se debata o tema das ocupações e se encaminhem diretivas para garantir o direito à cidadania e à moradia. Também será solicitado à Justiça que seja sustada qualquer ação de despejo até que a vara judicial tome providências.

O coordenador do Fórum das Ocupações, Luciano Ilha, disse que quer provar que o Fórum é legítimo e apartidário e jamais lutou no foco de tirar a propriedade das empresas. "Nós queremos, sempre, comprar a terra. Tivemos uma desocupação no dia 2 de junho, e o que aconteceu foi desumano, pois as pessoas que viviam naquela comunidade não tinham onde morar e passaram a noite na rua", disse. O coordenador ressaltou que a responsável pelo debate entre as partes interessadas nas ocupações é a prefeitura; no entanto, para ele, parece que ela não tem esta intenção. "Tem área ociosa em Porto Alegre e é óbvio que as pessoas que não têm onde morar vão ocupar o espaço. Temos de chegar no proprietário para negociar, mas não estamos conseguindo", destacou. Ilha afirmou que é preciso colocar o proprietário e o ocupante frente a frente para mostrar que a mobilidade das comunidades gira em torno da compra da área. "Vamos conquistar muito mais moradias unindo as ocupações, e não podemos parar por aqui", concluiu.

Reintegração

O representante jurídico do Fórum das Ocupações, Paulo Renê, disse que, atualmente, existem 350 mil pessoas que exigem moradia da prefeitura. "A luta poderia ser menos desgastante se os juízes entendessem que uma reunião entre as partes é melhor que uma reintegração de posse", disse. Silva ressaltou que, em agosto de 2014, houve uma manifestação gigantesca, e a prefeitura foi obrigada a ouvir o clamor de quem não tem onde morar. "Criou-se, então, uma Vara especializada, e isso está se realizando, pois o judiciário comprou esta ideia", destacou. O advogado afirmou que já está se falando em financiamento nacional para que as comunidades conseguissem adquirir as áreas. "Vocês não são invasores, não são grileiros e, sim, querem ter um local digno para morar", disse.
Paulo Renê disse que é preciso um projeto de lei que criminalize a especulação imobiliária, pois as áreas especuladas não estão exercendo a sua função social. "Sabemos que a situação do município não é boa financeiramente, mas não queremos nada de graça, queremos adquirir tais áreas", destacou. O advogado ressaltou que todas as áreas ocupadas devem ser contempladas, para que nenhuma fique de fora de um projeto de moradia que está sendo construído. "Temos de ter o tempo necessário para negociar com as empresas e, se tivermos que parar Porto Alegre novamente, faremos isso", concluiu.O vice-presidente da Federação Gaúcha das Associações de Moradores, Pedro Dias, destacou que é obrigação do estado gaúcho resolver as questões das ocupações. "E ele não pode se omitir, pois, por exemplo, não é obrigação da Brigada Militar despejar pessoas", disse. Dias ressaltou que é preciso que a questão das ocupações seja resolvida concretamente com os órgãos responsáveis, como o Departamento Municipal de Habitação (Demhab), pois é uma razão social e tem de haver uma política mais voltada à regularização fundiária. "Não podemos ver, hoje, ainda, pessoas jogadas na rua e crianças na rua. Onde estão os direitos das crianças? Os órgãos municipais, estaduais e federais são feitos para resolver esses problemas e não para despejar", disse. 

Negociações

O representante da União das Associações dos Moradores de Porto Alegre (Uampa), Candido Acosta, afirmou que tem acompanhado várias ocupações e se inteirado das negociações. "O judiciário tem de estar junto nesta luta para buscar soluções para as ocupações", disse. Acosta ressaltou que as empreiteiras, atualmente, não querem trabalhar em prol dos pobres e que seria preciso haver um percentual de construção para a comunidade de baixa renda, para não haver mais ocupações. "Não conseguimos estruturar a nossa vida, pois não sabemos se teremos onde morar amanhã. Onde estão as entidades governamentais que deveriam estar aqui para responder as nossas questões?", questionou. Candido Acosta disse que a moradia é uma política de estado por ser um direito do povo."Nós somos parceiros para buscar soluções para as ocupações, e o povo tem de estar mobilizado para buscar os seus direitos", destacou.

Lucinéia Silva, líder da Cruzeirinho, ressaltou a importância dapresença de pessoas ligadas à área da defesa dos direitos humanos. "Gostaria que eles estivessem aqui para vero descaso que aconteceu na Vila Monte Pio." Segundo a líder, no dia da ocupação,diversas casas foram demolidas. "Foram cenas tristes, vi uma guerraacontecendo. Os policiais foram ao encontro dos moradores sem o menorpudor."

A tenente-coronel do Comando de Policiamento da Capital,Cristine Rasdold, esclareceu o gerenciamento dessas ocupações. "Quando uma ordem judicial determina que devemos fazer esse tipo de ação, devemos serlegalistas e cumprir a ordem. Porém, todo um trabalho é desenvolvido para quecrianças, adultos e idosos não saiam em desvantagem." Cristine explicoutambém que um oficial de justiça é acionado para acompanhar de perto questõesreferentes aos direitos humanos. Conforme citou, o trabalho realizado pela tropa, nestas ocasiões, visa a preservar as famílias. "Fazemos um grande trabalho,para que esta intervenção não ocorra de um dia para outro. Nós tambémnos preocupamos com tudo isso, e por isso trabalhamos comdatas."

Procuradoria

A procuradora do Município Simone Somensi explicou aosenvolvidos que, para realizar a regularização fundiária, não deve haver brigajudicial, pois, segundo ela, isso interfere no seguimento do trabalho. "Desdeque ingressei na prefeitura, trabalho com esta questão de política habitacionale, na situação de vocês, meu trabalho é dar uma segurança. Mas para realizareste trabalho, preciso seguir regras. Hoje temos uma grande briga na Justiça, oque impede que o trabalho seja realizado com êxito." Simone citou também,os riscos de moradia que essas pessoas correm no local devido ao índice dealagamentos, desmoronamentos e contaminação. "São impeditivos legais. Seeu trabalhar sem levar esses aspectos em consideração, serei punida. Precisamosachar uma solução que se ajuste para todos os lados."

O vereador Carlos Casartelli (PTB) destacou que um dos problemasmais sérios de Porto Alegre são as condições de moradia. "Dentre diversosproblemas como a educação, segurança e saúde, enfrentamos diariamente, na nossaCapital, problemas de moradia. Conforme citou, para o problema ser solucionado épreciso que o município encontre soluções e que a Caixa Econômica Federal faça adequações às necessidades da população. "Vocês não são invasores, não são grileirose empreendedores, mas reconhecemos que existem, sim, grileiros e empreendedores que lucram às custas de vocês. Gostaria de dizer que estou junto nestaluta."



Texto: Juliana Demarco (estagiária de Jornalismo)
Clara Porto Alegre (estagiária de Jornalismo)