Entidades de negros e índios cobram aplicação de leis
No dia da Abolição da Escravidão (13/5), a aplicação efetiva da lei federal 10.639, modificada pela lei 11.645, foi cobrada por entidades ligadas às culturas negra e indígena e aos direitos humanos na reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esportes (Cece), da Câmara Municipal de Porto Alegre. A legislação prevê a obrigatoriedade do ensino das culturas e das histórias afro-brasileiras, africanas e indígenas nas escolas de todo o país.
A lei é para ser cumprida, mas contar a história do povo negro não é só falar de capoeira e samba, disse Marisa da Silva, da União de Negros pela Igualdade (Unegro), que solicitou a reunião. Na sua opinião, o legado dos negros em todas as áreas do conhecimento humano deveria estar gravado nos livros. Temos muitos pensadores e cientistas negros, mas, nos livros de história, os negros só aparecem cortando cana-de-açúcar. Quando a história for para os livros, teremos um conteúdo muito grande para desconstruir o racismo, afirmou. A educação começa dentro de casa, mas a desconstrução do preconceito é na escola.
O professor Zaqueu Claudino, da Federação Indígena do Rio Grande do Sul, lamentou a morosidade do Estado brasileiro em cumprir as leis. Passaram-se 25 anos da Constituição Federal, mas diversos artigos não foram estabelecidos na prática, declarou. Claudino criticou o fato de as leis 10.639 e 11.645 não terem sido efetivamente implantadas. Aqui em Porto Alegre, conversamos muitas vezes com a Secretaria Municipal de Educação (Smed), mas nunca tivemos êxito, afirmou. Conforme Claudino, é fundamental que a cultura e a história dos índios sejam conhecidas por todas as crianças, para que se tornem adultos sem preconceito contra esses povos. A discriminação acontece pelo desconhecimento da causa, frisou.
As professoras Maíra Lopes de Araújo e Caroline Ponso, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Vila Monte Cristo, apresentaram o projeto Capoeira em Diálogo, desenvolvido na instituição, que combina a prática física e conhecimento de valores culturais, como o conceito de axé (energia vital). Maíra, que leciona Educação Física e é capoeirista, disse que o projeto nasceu da vontade e do esforço da escola. Hoje, segundo ela, a capoeira e elementos da cultura negra são trabalhados também nas outras aulas, como teatro e música, e até na alfabetização. Maíra ainda lamentou a revogação da lei da Semana Municipal de Capoeira, que deveria ser realizada anualmente. Há avanços e retrocessos. Devemos unir esforços para implantar de fato a lei 10.639, pediu.
Pedagogia griô
Representantes do Executivo municipal garantiram que diversos projetos para a implementação da lei 10.639 e suas alterações estão em andamento no Município. O diretor pedagógico Sílvio Capaverde lembrou que a rede municipal de ensino conta com 96 escolas, além de 216 instituições conveniadas. Segundo ele, o esforço é realizar a desconstrução do racismo por meio do conhecimento, tanto que foi criada, em 2012, a Assessoria de Educação das Relações Étnico-raciais.
O assessor de Relações Étnico-raciais da Smed, Vanderlei de Paula Gomes, afirmou que os projetos da secretaria valorizam a história, os costumes e as tradições dos povos, sendo norteados por uma pedagogia griô, dos mestres populares, e não só dos acadêmicos. Gomes disse que são oferecidos cursos para professores e há parceria com a Ufrgs. Também informou que está sendo rearticulado o GT de Educação, que reúne, mensalmente, cerca de 30 professores e multiplicadores, e que serão remodelados os núcleos dentro de cada escola. Como atestou, uma das preocupações é garantir a formação continuada. De acordo com ele, em 2013, a Smed incluiu 34 propostas no programa Mais Cultura na Escola, da União, das quais 16 estão aptas a receber recursos este ano.
Seminário
Como encaminhamento da reunião, presidida pelo vereador João Derly (PCdoB) e pela vereadora Sofia Cavedon (PT), ficou definida a realização de um seminário em conjunto com a Comissão de Direitos Humanos (Cedecondh) e participação de representantes das escolas, das entidades e do Executivo. O vereador Tarciso Flecha Negra (PSD) convidou os participantes para as atividades culturais em homenagem ao Dia da Abolição, a partir das 14 horas de hoje no Teatro Glênio Peres.
Também compareceram à reunião Mestre Farol, da Federação Gaúcha de Capoeira; Maria Cristina Peixoto Correia, da União Brasileira de Mulheres; e Elisete Moretto, secretária-adjunta do Povo Negro da Secretaria Municipal de Direitos Humanos.
Texto: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)
Edição: Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)