1964: Reformas de Base

Cristovam Buarque propõe federalizar a educação de base

Senador (d) disse que país ainda precisa das reformas de 1964 Foto: Ederson Nunes
Senador (d) disse que país ainda precisa das reformas de 1964 Foto: Ederson Nunes
A mais importante das reformas de base necessárias, atualmente, é a reforma da educação. A afirmação é do senador trabalhista Cristovam Buarque, durante palestra feita nesta segunda-feira (1º/4) à tarde no plenário Otávio Rocha da Câmara Municipal de Porto Alegre. Cristovam participou do painel O golpe de Estado e a Guerra Fria, no seminário 1964: Reformas de Base, promovido pelo Legislativo Municipal.

"A reforma da educação é a mãe das outras reformas. Se fizermos essa reforma, as outras virão a seguir", assegurou Cristovam. Classificando uma reforma como algo similar a uma revolução, afirmou: "Para desacorrentar o cérebro dos brasileiros é necessário uma reforma radical, próxima e atualizada ao século XXI. Hoje, o grande capital é a inteligência, não mais a terra. Não há liberdade intelectual sem democracia, mas não há democracia sem que se coloquem as pessoas dentro das fábricas de desenvolvimento intelectual, as escolas."

Para o senador, a reforma educacional passa pela federalização da educação de base no Brasil. Ele defende que o Brasil tenha escolas federais espalhadas em todo o país, seguindo o exemplo do que Leonel Brizola fez em relação aos Cieps, quando governou o Rio de Janeiro. "A substituição do atual sistema de educação municipal e estadual por um sistema federal faria com que cada criança no país tivesse o mesmo valor para a educação, independentemente das suas condições. Com escola igual para todos, a desigualdade diminuirá e não será mais transmitida por herança, como ocorre atualmente. Dependerá do talento e da persistência de cada um."

Uma reforma de base, disse Cristovam, deve propiciar o acesso de todos ao produto de alta tecnologia. "Nossos automóveis são fabricados no Brasil, mas não são criados aqui. Essa é a nossa diferença para a Coreia. Uma parte da nossa renda vai embora sob a forma de pagamento de patentes."

Nacional

De acordo com o senador, é necessário que a reforma educacional crie e implante uma carreira nacional para o magistério. "É preciso atrair nossos melhores jovens para a carreira do magistério, com um sistema de seleção muito rigoroso e cuidadoso que leve em conta a habilidade e dedicação para ser professor. Hoje não conseguiríamos mais do que 30 mil ou 40 mil jovens brasileiros para serem bons professores, e nós precisamos de 2 milhões de docentes. Hoje, os professores têm de usar equipamentos modernos, de alta tecnologia." 

Cristovam Buarque entende ainda que esses professores não devem ter estabilidade absoluta. "Se ele for mal avaliado, não deve continuar no cargo. É possível fazer essa reforma em 20 ou 30 anos. A implantação pode ser feita por cidades. Podemos, ao longo de 20 anos, implantar Cieps em 250 cidades e acompanhar os resultados. Isso só seria possível com dinheiro da União. O investimento em educação de base significaria 6,4% do PIB (Produto Interno Bruto). Isso não está fora das possibilidades do país." 

O senador ressalta, no entanto, que "há raízes profundas, no Brasil, que não aceitam essas reformas", da mesma forma como não as aceitaram em 1964. "Fomos acostumados a viver numa sociedade desigual. É preciso acabar com o preconceito que temos em deixar os pobres entrarem nas nossas universidades e fazer a reforma de base da educação. As reformas de base que precisamos hoje são tão importantes quanto aquelas que precisávamos em 1964, com acesso à mesma qualidade na educação.

Reflexão

De acordo com Cristovam Buarque, é necessário refletir por que aconteceu o golpe militar no Brasil há 49 anos e sobre o que deve ser feito para que o Brasil melhore. "Em 1964, corríamos o "risco" do Brasil ficar muito melhor se as reformas de base tivessem sido feitas", disse o senador. Para ele, as reformas de base propostas por Jango tinham como principais objetivos "a liberação de recursos que deixavam o país acorrentado" e libertar o país do "acorrentamento pela escravidão".

Cristovam disse ter convicção de que a escravidão, no Brasil, não acorrentou apenas os escravos, mas o país todo. "Ainda no século XX, a terra era acorrentada pelos latifundiários, não era usada. E havia homens acorrentados pela falta do direito a trabalhar na terra. Era preciso uma reforma agrária para que esses homens pudessem trabalhar para produzir na terra. Essa 
quebra de poder poderia ter sido feita ainda naquela época. E a terra acorrentada fez criar esses desastres urbanos que são as nossas cidades, pela migração de pessoas do campo para a cidade."

Na opinião de Cristovam, as reformas de base de Jango também visavam a "desacorrentar" o sistema financeiro, "que tirava dinheiro do povo para investir na especulação". Esse dinheiro, segundo ele, precisava ser usado para a produtividade. "As reformas de base não se destinavam apenas para desacorrentar recursos, mas que o produto disso fosse melhor distribuído entre a população. Isso não podia ser permitido, pois faria o Brasil muito melhor." Conforme o senador, a elite não queria desacorrentar o país: "Não queriam que as reformas de base acontecessem e que o país fosse independente fora do bloco ocidental da cortina de ferro. Pagamos um preço muito alto por aquele erro nacional. Os militares foram os executores, mas a nação seguiu o caminho errado."

Proposta

O senador Cristovam Buarque disse que, 49 anos após o golpe militar no Brasil, é preciso definir quais reformas de base precisam ainda ser feitas no país. Segundo ele, uma reforma urbana deve priorizar a melhoria da qualidade de vida nas pequenas e médias cidades, desacorrentando as cidades do controle que automóvel exerce sobre elas. "É preciso haver uma mudança na maneira como nós pensamos as cidades e criar condições para frear a migração em direção às metrópoles."

Ele também defendeu que haja uma reforma do sistema bancário, "para que nossos bancos deixem de ser especuladores, especialmente com a dívida pública, liberando o dinheiro que o país tem", e uma 
reforma do sistema de saúde que seja capaz de enfrentar as resistências que advirão. "É preciso olhar a saúde com a ótica do paciente, e não com a dos trabalhadores do sistema. A saúde deve ser pública e não apenas estatal como ela é hoje."

Para Cristovam, ainda seria necessária um reforma política e um novo pacto federativo. "Os partidos políticos atuais representam clubes eleitorais, sem identidade ideológica. A reforma política não dever ser apenas a questão da fidelidade partidária. Na última eleição para os municípios, a campanha eleitoral teve custo de R$ 30 por eleitor. Não é democrática uma campanha que gasta tanta dinheiro com marketing ou comprando voto. A União absorve todos os recursos e não os devolve na quantidade devida. O novo pacto federativo deve passar por algo que unifique o país."

Texto: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)